Tratamento de tumor gastrointestinal diagnosticado cedo tem sucesso acima de 60%, mas maioria dos casos é descoberta tardiamente
Tratamento de tumor gastrointestinal diagnosticado cedo tem sucesso acima de 60%, mas maioria dos casos é descoberta tardiamente
Dados epidemiológicos anunciados pelo A.C.Camargo, centro de referência mundial em ensino, pesquisa e tratamento de câncer, demonstram que o diagnóstico precoce de tumores gastrointestinais é fundamental para o sucesso do tratamento, possibilitando que entre 6 e 9 a cada 10 pacientes estejam vivos cinco anos após a descoberta da doença. Para chegarem a essa conclusão, o Núcleo de Cirurgia Abdominal e a equipe de Estatística da Instituição analisaram os perfis de 897 pacientes diagnosticados com câncer de estômago, esôfago, fígado e pâncreas e tratados entre 2000 e 2007.
Quando descobertos precocemente – quando o diagnóstico ocorre entre os estádios 0 e 2 –, os tumores de estômago são curados em 90% dos casos (estádio 0), 68% (estádio 1) e 45% (estádio 2). Já o câncer de esôfago em fase inicial tem sobrevida em cinco anos ainda melhor, variando de 100% (estádio 0) a 84% (estádios 1 e 2). A tendência se confirma com o câncer de fígado e de pâncreas, o primeiro registrando 89% (estádio 1) e 88% (estádio 2) e o segundo com taxas de 64% (estádio 1) e 33% (estádio 2).
O estudo, no entanto, não traz apenas boas notícias. Destaca-se o alerta de que, na maioria dos casos, os tumores gastrointestinais são descobertos nas formas mais avançadas da doença. De acordo com o cirurgião oncologista e diretor do Núcleo de Cirurgia Abdominal do A.C.Camargo, Felipe José Fernández Coimbra, a falta de informação por parte do paciente e até mesmo da comunidade médica leva ao elevado índice de tumores gastrointestinais descobertos tardiamente. "Na maioria dos casos, os pacientes demoram a procurar o médico e, quando isso ocorre, muitas vezes o médico generalista não solicita o exame correto e tampouco encaminha ao serviço de saúde especializado. Assim como ocorre para outros tumores, como mama e próstata, são necessárias campanhas de esclarecimento tanto da população quanto dos profissionais de saúde", destaca Coimbra.
O mais alarmante é o câncer de pâncreas, cujo diagnóstico tardio ocorreu em 80,8% dos casos e a sobrevida em cinco anos foi de apenas 12% (estádio 3) e 3% (estádio 4). Já os tumores de estômago foram descobertos tardiamente em 66,4% dos casos, com sobrevida em cinco anos de 45% (estádio 3) e 14% (estádio 4). O diagnóstico tardio ocorreu também em 69,1% dos tumores de esôfago, com sobrevida de 38% (estádio 3) e de apenas 3% (estádio 4) e em 76,3% dos tumores originados no fígado, com sobrevida de 23% (estádio 3) e 9% (estádio 4). Dependendo do prognóstico clínico, alguns pacientes não foram submetidos à cirurgia. Confira os números:
Câncer de estômago:
- estádios 0 a 2 - 53 casos (33,6%) - sobrevida em cinco anos de 90% (estádio 0), 68% (estádio 1) e 45% (estádio 2)
- estádios 3 e 4 - 105 casos (66,4%) - sobrevida em cinco anos de 45% (estádio 3) e 14% (estádio 4)
Câncer de esôfago:
- estádios 0 a 2 - 153 casos (30,9%) - sobrevida em cinco anos de 100% (estádio 0), 84% (estádio 1) e 84% (estádio 3)
- estádios 3 e 4 - 342 casos (69,1%) - sobrevida em cinco anos de 38% (estádio 3) e 3% (estádio 4)
Câncer de fígado:
- estádios 0 a 2 - 19 casos (26,4%) - sobrevida em cinco anos de 89% (estádio 1) e 88% (estádio 2)
- estádios 3 e 4 - 53 casos (76,3%) - sobrevida em cinco anos de 23% (estádio 3) e 9% (estádio 4)
Câncer de pâncreas:
- estádios 0 a 2 - 33 casos (19,2%) - sobrevida em cinco anos de 64% (estádio 1) e 33% (estádio 2)
- estádios 3 e 4 - 139 casos (80,8%) - sobrevida em cinco anos de 12% (estádio 3) e 3% (estádio 4)
Dicas sobre prevenção e diagnóstico precoce
Câncer de estômago - Os sintomas iniciais são bastante inespecíficos, podendo ser confundidos com outras doenças como gastrite. "Com isso, os pacientes precisam buscar logo um especialista e realizar o exame de endoscopia digestiva", destaca Felipe José Fernández Coimbra. Em alguns casos, segundo ele, os pacientes podem se queixar de dificuldade de deglutição (engolir) e refluxo ácido. Quando começam a ocorrer perda de peso importante, vômitos e aumento do volume do abdome pela presença de líquido em seu interior (ascite), já pode ser sinal de doença avançada. O principal fator de risco para esse câncer é a infecção pelo H. pylori, bactéria presente em água e alimentos contaminados e que acomete metade da população mundial e que em cerca de 5% dos casos leva a um processo inflamatório crônico do estômago que pode evoluir para a doença.
O alto consumo de sal, de alimentos com conservantes e defumados e a pouca ingestão de frutas e verduras também são fatores de risco relacionados ao desenvolvimento do tumor de estômago. Outros fatores que podem ser destacados incluem o tabagismo, história familiar de câncer gástrico e cirurgia prévia por úlcera. Também pertencem ao grupo de risco famílias oriundas de países com alta incidência de câncer de estômago como China e Coreia do Sul.
Câncer de fígado - O diagnóstico deste tumor é feito pela associação de exames de imagem (ultrassonografia, tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética) e laboratoriais (dosagem de alfafetoproteína – uma substância produzida pela maior parte desses tumores). Eventualmente uma biópsia de lesões suspeitas pode ser necessária. O PET-CT tem se demonstrado útil no estadiamento e para decisão terapêutica em casos selecionados. Geralmente, a doença é pouco sintomática nas fases iniciais e, quando os principais sintomas aparecem, já indicam doença em fase avançada, incluindo a perda de peso, o aumento do volume abdominal (acúmulo de líquido dentro do abdome – ascite) e a icterícia (coloração amarelada dos olhos e da pele pelo acúmulo de bilirrubina no organismo). Quadros de Hepatite B ou C precisam ser tratados por um especialista, pois podem gerar quadros de cirrose ou levar ao desenvolvimento de hepatocarcinoma, o tipo mais comum de câncer de fígado.
Câncer de esôfago - Tipo de câncer que é de três a quatro vezes mais comum entre homens. Os fatores de risco relacionados ao câncer do esôfago são idade, história familiar e fatores extrínsecos como álcool, fumo (fumado, mascado ou aspirado), infecções orais por fungos, agentes infecciosos (como o HPV), deficiência de riboflavina e vitamina A, contaminação de produtos alimentícios por micotoxina fumonisina e ingestão excessiva em temperatura elevada de erva-mate, muito comum no sul do Brasil, na Argentina e no Uruguai. Além disso, a doença de refluxo pode aumentar em 70% o risco de uma pessoa desenvolver câncer de esôfago. Levantamento do A.C. Camargo junto a 120 pacientes com esse tipo de câncer mostra que 40% sofriam de refluxo, doença que atinge cerca de 20 milhões de brasileiros. Comum em pessoas com mais de 50 anos, o refluxo é causado pelo retorno do conteúdo do estômago ou do duodeno ao esôfago. A sensação causada é de azia e queimação. Com o contato constante das enzimas digestivas com a parede do esôfago, o órgão passa a apresentar lesões e tecido parecido com o do estômago. As células danificadas por esse processo sofrem mutações e podem se tornar cancerígenas. O tratamento é feito com dietas e mudança de hábitos alimentares. Os pacientes não devem ingerir café, chá, refrigerantes, bebidas alcoólicas e alimentos com muito molho, principalmente o de tomate. É recomendado também que as pessoas não se deitem logo após a refeição e mantenham o peso adequado. Alguns sintomas como anemia, perda de peso, vômitos e dificuldade de engolir podem indicar um tumor.
Câncer de pâncreas - Na maioria dos pacientes portadores de câncer de pâncreas, o quadro clínico é inespecífico, com icterícia (coloração amarelada da pele, nos tumores que acometem a região da cabeça do órgão) indolor ou dor nas costas associada à perda de peso. Urina escurecida (colúria) e fezes esbranquiçadas (hipocolia fecal) também podem estar presentes. Emagrecimento é uma queixa comum, podendo ser acompanhado de dores nas costas e depressão. Há relação direta entre o número de cigarros consumidos e sua incidência. Fumantes têm risco aumentado em 2 a 6 vezes em relação a não fumantes. Há risco aumentado para os que apresentam quadros de pancreatite crônica ou diabetes. Antecedente familiar de câncer de pâncreas também está relacionado ao risco de aparecimento desse tipo de câncer. Estudo recente também correlacionou o consumo crônico de bebida alcoólica com aumento de risco. Há relação também com síndromes hereditárias. Outro fator de risco importante é a própria idade avançada dos pacientes, pois, após os 50 anos, a cada década que se vive, observa-se um aumento de risco, o que deve levar a uma elevação da incidência desse tumor com o aumento da expectativa de vida da população.
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