O câncer de rim e sua relação com o hormônio renina
O câncer de rim e sua relação com o hormônio renina
Conduzido pelo corpo clínico do A.C.Camargo Cancer Center, estudo abre uma outra perspectiva sobre a função endócrina renal: seus hormônios podem ser fatores prognósticos para câncer?
O câncer de rim também orbita pelo universo de Novembro Azul. Há mais de 15 variações dele. Entre elas, o carcinoma de células claras é um dos tipos histológicos mais comuns – cerca de 70% dos casos.
Apesar de vinculado ao âmbito dos tumores urológicos, falta à literatura médica um olhar mais amplo sobre o rim “endócrino” como fator prognóstico. “Ele também é um órgão endócrino, que tem a função de produzir hormônios vitais”, analisa o head do Departamento de Tumores Urológicos do A.C.Camargo Cancer Center, Stênio Zequi.
Hormônios estes como a renina, objeto desta pesquisa do Dr. Felipe de Almeida e Paula, aluno da pós-graduação do A.C.Camargo. Um trabalho coordenado pelo Dr. Stênio.
Publicada no periódico Urologic Oncology: Seminars and Original Investigations, a pesquisa foi batizada como Immunohistochemical Expression of Renin is a Prognostic Factor for Recurrence in Nonmetastatic Renal Cell Carcinoma (A Expressão Imuno-Histoquímica da Renina é um Fator Prognóstico para a Recorrência do Carcinoma de Células Renais não Metastático).
Entendendo o carcinoma de células claras
Antes de falar do hormônio renina, vamos compreender o tipo de câncer de rim analisado. O carcinoma de células claras detém uma agressividade especial, uma vez que não responde bem à radioterapia e à quimioterapia.
“A melhor chance de cura é com cirurgia”, avisa o Dr. Stênio. Quanto mais precoce o diagnóstico, menor é o tamanho do nódulo, fato que representa mais possibilidades de sucesso. O problema é que a maior parte dos pacientes o câncer de rim não apresenta sintomas.
“Em nódulos com até 4 centímetros, a gente faz uma cirurgia que remove o nódulo e preserva o rim, a nefrectomia parcial. É uma cirurgia poupadora de néfrons, algo que mantém a qualidade de vida da pessoa. Há cura em 95% dos casos”, frisa Stênio Zequi.
Quando o paciente é muito idoso ou enfermo e não suporta uma anestesia, faz-se uma ablação percutânea. “É uma punção na pele com agulha guiada por tomografia. A gente eleva a temperatura a 70º com rádio frequência, que é uma queimadura, ou diminui a -70º com crioterapia, que é uma ‘geladura’; são técnicas minimamente invasivas”, explica o médico.
Existem ainda outras possibilidades de tratamento para esse câncer de rim. Quando metastáticos, os pacientes respondem à terapia de alvo molecular. Há várias drogas inteligentes divididas por determinados alvos, como anti-VEGFR e outras.
“De uns três ou quatro anos para cá, a revolução está acontecendo com a imunoterapia, na qual se alcançam respostas muito interessantes mesmo em cânceres avançados e agressivos”, afirma o Dr. Stênio.
Câncer de rim, renina e eritropoetina
Conforme mencionado previamente, o rim é também um órgão endócrino, que produz hormônios.
Um deles é a eritropoetina, importante para manter os níveis de hemoglobina e evitar a anemia, que pode estar presente em quem tem câncer renal.
O outro é a renina, hormônio fundamental no controle da pressão arterial – hipertensos, por exemplo, usam drogas que agem na renina.
“Já publicamos uma pesquisa em 2017 que evidenciou que quem tem baixa expressão da eritropoetina conta com maior chance de morte por câncer, morte global, recidiva (volta do tumor) ou metástase”, diz Stênio Zequi. Faltava avaliar melhor a renina.
A pesquisa
Para esse estudo retrospectivo foram avaliados os níveis de renina de 498 pacientes com carcinoma de células claras não metastático.
Eles foram submetidos à nefrectomia parcial ou radical entre 1990 e 2016. São dados que provêm do banco do LARCG - Latin American Renal Cancer Group.
Conclusões
O estudo ainda tem caráter de investigação, não é comercial, mas abre caminhos para que, no futuro, baste, por exemplo, uma biópsia ou cirurgia do rim para analisar esse marcador como um prognóstico para a evolução da doença.
“Foi constatado que quem tem expressão negativa ou baixa da renina conta com duas a três vezes mais chances de ter um retorno do tumor”, explica Stênio.
Ou seja, a expressão imuno-histoquímica intratumoral da renina em pacientes com carcinoma de células claras fornece dados prognósticos sobre a probabilidade de recorrência do câncer de rim.
“Com mais estudos biomoleculares, quem sabe teremos seis, sete, oito marcadores para avaliarmos com mais precisão como aquele tumor poderá evoluir ou retornar”, afirma o médico, que ressalta que há mais de uma década os grupos de Urologia e Anatomia Patológica do A.C.Camargo vêm investigando esses marcadores em carcinomas do rim.
Vale ressaltar a importância valiosíssima dos pacientes que aceitam participar das pesquisas, que permitem a utilização de suas informações clínicas e dos fragmentos dos tumores deles, ou de suas amostras sanguíneas, num ato de desprendimento em favor da ciência.
“Eles estão dando sua parcela de contribuição para a ciência. Talvez essas pesquisas não tragam benefício imediato a eles, mas, para as próximas gerações, esses pacientes ajudam a edificar uma bela história, cada um contribuindo com seu tijolinho”, finaliza o Dr. Stênio.
Para conferir o estudo na íntegra (em inglês), clique aqui.
Há ainda outro estudo conduzido pela equipe de urologia, um que envolve cirurgia robótica: veja esse paper (em inglês) ao clicar aqui.
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