Pesquisadores do A.C.Camargo identificam relação entre bactérias do intestino e câncer colorretal

 
Publicado em: 02/04/2019 - 17:04:42

O estudo, que ganhou destaque na Nature Medicine, mostrou que o tumor pode ter origem nas alterações da microbiota intestinal

Um estudo envolvendo institutos de pesquisa de sete países em três continentes revela que o intestino de pacientes com câncer colorretal possui microorganismos diferentes daqueles que colonizam a microbiota intestinal de indivíduos saudáveis. A descoberta foi publicada nesta segunda-feira, 1 de abril, na Nature Medicine, uma das mais prestigiadas publicações científicas internacionais. 

Liderado por pesquisadores do A.C.Camargo Cancer Center, da Universidade de São Paulo e da Universidade de Trento, na Itália, propõe não apenas mecanismos que podem ajudar a explicar a origem do câncer de intestino e reto, mas também novos métodos diagnósticos para este que é o terceiro mais comum no mundo e no Brasil, onde atinge mais de 36 mil homens e mulheres por ano, ou seja: a cada dia cerca de cem brasileiros recebem o diagnóstico da doença. 

A pesquisa 
A microbiota intestinal tem sido foco de análise de pesquisas em todo o mundo – enquanto é clara a correlação da bactéria Helicobacter pilori com o câncer de estômago, ainda não havia se estabelecido uma relação clara entre os micróbios da flora intestinal e o câncer colorretal. Neste estudo, os pesquisadores estabeleceram um painel de 16 microorganismos associados ao câncer colorretal e suas assinaturas metabólicas, que têm um poder preditivo para a doença. 

Para identificar as assinaturas, as equipes analisaram material genético em amostras ambientais extraídas das fezes de 969 pessoas identificadas em grupos com e sem câncer. O estudo metagenômico utilizou ferramentas de alta precisão, o que permitiu identificar bactérias sem referência genômica e sem necessidade de isolamento em laboratório. Foram usadas amostras de populações da Alemanha, França, Itália, China, Japão, Canadá e Estados Unidos.

Com bancos de dados heterogêneos, a identificação das bactérias é uma estratégia diagnóstica e terapêutica para o câncer colorretal, tem alto índice de cura quando identificado precocemente, e para a doença de Crohn e retocolite ulcerativa, que não têm cura mas podem ser controladas a partir de um diagnóstico precoce. 

Os cientistas rastrearam as vias de fermentação e putrefação das bactérias que transformam ácidos biliares – que fazem parte dos nossos sucos digestivos - em produtos de seu metabolismo que têm poder cancerígeno. Certas classes de bactérias degradam a colina - nutriente presente na carne, ovos e outros alimentos – e o transformam em um metabolito potencialmente perigoso já associado a doenças cardiovasculares e, agora, ao câncer de cólon e reto. 

Por essa e outras descobertas recentes que atestam a relação entre os micróbios e o desenvolvimento do câncer, os pesquisadores levantam, por exemplo, a questão de como modular a microbioma, impedindo que certas espécies colonizem o nosso intestino. “É um desafio”, afirma o biólogo Andrew Thomas, o primeiro e um dos principais autores do estudo. “O achado permite alta acurácia no diagnóstico precoce, em combinação com exame de sangue oculto nas fezes e ilumina um caminho seguro para novas investigações – por exemplo, em estudos com modelos animais para observação do comportamento da colina e suas associações”, afirma. 

Thomas desenvolveu a pesquisa em seu mestrado no A.C.Camargo e doutorado na USP e Universidade de Trento, sob orientação do biólogo Emmanuel Dias-Neto, do Centro Internacional de Pesquisas (Cipe) do A.C.Camargo Cancer Center, e do engenheiro João Carlos Setúbal, Professor de Bioquímica da USP. Ele atuou também com o bioinformata Nicola Segata, da Universidade de Trento, outro dos autores principais. Para Segata, “o microbioma é fortemente dependente de fatores como dieta, estilo de vida e meio ambiente”. E neste contexto, continua, “é necessário considerar populações geográfica e culturalmente diversas para se obter reações químicas globalmente associadas ao câncer colorretal”. A pesquisa teve o apoio de diversas instituições, incluindo a Fundação de Apoio Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

 

 

Avaliação de conteúdo

Você gostaria de avaliar esse conteúdo?
Esse conteúdo foi útil?
Gostaria de comentar algo sobre esse conteúdo?
Ao continuar você confirma ter ciência de nossa Política de Privacidade e dos respectivos Avisos de Privacidade e Proteção de Dados presentes em nosso Portal de Privacidade.
CAPTCHA
Esta pergunta é para testar se você é humano e para evitar envios de spam

Veja também

A bebida alcoólica eleva o risco de um câncer de boca?
A bebida alcoólica pode ser, sim, um fator de risco para o desenvolvimento de um câncer. Essa associação ocorre não apenas para um tumor de cabeça e pescoço, como boca, faringe e laringe. O álcool também pode implicar problemas no esôfago, mama e intestino grosso...
Podcast Rádio Cancer Center #20 - O cirurgião oncológico
Conheça o papel deste especialista essencial A conversa de hoje é sobre o papel do cirurgião oncológico. Vamos falar da atuação desse especialista que é vital para o tratamento do câncer. Trata-se de um profissional que não somente é preparado para conduzir cirurgias de alta...
Podcast Rádio Cancer Center #19 - Julho Verde e a reabilitação de um câncer de cabeça e pescoço
Conheça mais as possibilidades terapêuticas da fonoaudiologia e da estomatologia Neste Julho Verde, mês de conscientização para o combate aos tumores de cabeça e pescoço (leia mais a seguir), é importante falar de reabilitação. É fundamental ressaltar as possibilidades de tratamento e até mesmo conhecer...
Como eu me tornei uma oncologista
Para marcar este 9 de julho, Dia do Oncologista, saiba mais sobre a profissão com o depoimento da Dra. Maria Nirvana da Cruz Formiga, oncologista clínica do Departamento de Oncogenética do A.C.Camargo “A oncologia é uma área que me encantou desde o 5° ano da...
Julho Verde: 9 mitos & verdades sobre o câncer de cabeça e pescoço
Julho Verde: os tumores de cabeça e pescoço representam o nono tipo de câncer mais comum no mundo, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Incluindo todas as áreas da cavidade oral, como a língua e boca, e órgãos como laringe, faringe, seios...